sábado, 4 de janeiro de 2014

CRÓNICA | Rúben Rodrigues colocou-se perante a morte como o vi colocar-se perante o jornalismo


Conheci a figura de Rúben Rodrigues passando rente ao teto da carrinha da biblioteca intinerante da Gulbenkian.

Não sei quanto é que media, mas o seu perfil retilínio, uma voz grave, uma gargalhada troante e o semblante carregado em momentos de tensão, bastavam para se perceber quem tínhamos pela frente.

Falo, como é óbvio, da figura pública. Não tanto do professor, nem do autarca. Tenho em vista, sobretudo o jornalista.

Doente e um pouco alquebrado, já com 79 anos de idade, Rúben Rodrigues colocou-se perante a morte como o vi colocar-se perante os desafios que assumiu enquanto agente da comunicação social.

Dezoito dias antes do seu desaparecimento lançou o primeiro de dois volumes de uma obra que estava a escrever. E na mesma ocasião anunciou mais um livro!

O destino, que esgrime armas diferentes das nossas, acabou por levar a melhor. Mas Rúben Rodrigues deixou no ar a impressão de que apenas esse argumento foi capaz de contrariá-lo.

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Rúben Rodrigues destacou-se na defesa do que considerava ser o interesse da ilha do Faial, causa na qual se empenhou num firme combate

Tinha nascido a 16 de novembro de 1934, na cidade da Horta. Foi professor, jornalista e autarca.

Formado pela Escola do Magistério Primário da Horta lecionou no Faial, no Pico e na Terceira.

Em 1966, quando ainda se encontrava na Madalena, entrou para a Fundação Calouste Gulbenkian. Já no Faial tornou-se conhecido e popular através do seu trabalho na biblioteca itinerante daquela fundação.

Iniciou-se na política ainda antes do 25 de Abril desempenhando o cargo de vereador na Câmara Municipal da Madalena. No Faial, após a Revolução dos Cravos, fez parte da comissão administrativa da Câmara Municipal da Horta. Em 1993 candidatou-se como independente nas listas do Partido Socialista à Assembleia Municipal da Horta, cuja presidência veio a assumir. Foi mandatário na ilha do Faial da recandidatura de Mário Soares à Presidência da República.

Presidiu à Direção do Angústias Atlético Clube.

Na imprensa dirigiu durante largos anos o diário O Telégrafo, de onde saiu no ano em que o matutino atingiu o centenário e mudou de propriedade. Também esteve à frente do diário Correio da Horta. Colaborou com diversos jornais, com a rádio e com a televisão.

Oficial da Ordem de Mérito, distinção atribuída pelo presidente da República Jorge Sampaio, foi também agraciado pelo município da Horta por causa do seu papel no jornalismo, em que se destacou na defesa do que considerava ser o interesse da ilha do Faial, causa na qual se empenhou num firme combate.

Para além do primeiro volume da obra "Ilha do Fayal - Século XX - Nótulas Históricas sobre as suas principais crises sísmicas" (respeitante ao terramoto de 1926), agora lançado, é autor de "Nascido do Magma", "O Professor" e "Macau - O último baluarte".

Estava na sua mente, de acordo com o jornal Tribuna das Ilhas, concluir o segundo volume da obra que lançou neste mês, sobre os sismos de 1957, 1973 e 1998 e ainda escrever a continuação de "Nascido do Magma", que intitularia "América! Utopia e Realidade".

No site adispora Victor Rui Dores escreveu: "Desde que, há já alguns anos deixou os jornais, sentia-se a presença invisível de Ruben Rodrigues nas suas deambulações entre o Faial e o Pico. Alguns julgavam que ele estaria a fazer uma longa travessia no deserto. Enganaram-se. Afinal, Ruben Rodrigues vinha escrevendo-se e escrevendo-nos."

[Crónica enviada para um programa da Rádio Montanha, transmitido em cadeia com a Antena Nove, realizado por José Manuel Caldeira nesta data]



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